segunda-feira, 25 de abril de 2011

A NINFA INCONSTANTE



*Luíz Horácio Pinto Rodrigues


A protagonista de A ninfa inconstante não é Estela, não é Cuba, tampouco o narrador. A memória é a grande estrela desse belo trabalho de Guilhermo Cabrera Infante. "Não me interessa eliminar e muito menos mudar meu passado. Preciso é de uma máquina do tempo para vivê-lo de novo. Essa máquina é a memória."




A memoria, infelizmente, nem sempre desperta tão somente lembranças satisfatórias, é de sua natureza conservar lamentos e frustrações. O narrador de A ninfa inconstante também se depara com essa face opaca das emoções.

“Agora sei que o momento em que a vi pela primeira vez foi um momento equivocado".

Estela não tem dezesseis anos, nem alta nem baixa, a lolita blasée de Infante tampouco tenta se fazer sedutora. Não disfarça seu desconforto frente ao discurso desse crítico de cinema que, eu não afirmaria que se apaixonou, mas que se deslumbrou. O intelectual é casado com uma mulher que, deixa claro, já não difere mais os momentos em que está em sua presença daqueles de ausência. Convém não se apressar, paciente leitor, A ninfa inconstante não é mais um daqueles romances onde o “tio” se apaixona pela ninfenta, longe disso.




O intelectual é arrogante, chato, um reservatório de citações literárias e cinematográficas; mas está longe de ser um “tio” bobão, muito longe. Estela não é ingênua e carrega um plano, prova maior de sua falta de inocência.

O narrador não elucubra planos e mais planos para conquistar Estela, sua satisfação é admirar aquela juventude bela, enquanto isso sua vida se esvai. Mas como ganhar tempo, como superar o paradoxo que se agiganta a sua frente: matar a sede de viver.

Como cenário a cidade de Havana, uma Havana ainda musical e sensual.




A ninfa inconstante, obra póstuma de Guilhermo Cabrera Infante, pode ser lida como um balanço de sua produção, uma síntese, caso você prefira assim, caro leitor. Nessa narrativa estão bem nítidas todas as todas as possibilidades do estilo desse autor: os jogos de palavras que sermpre o seduziram, as referências cinematográficas e literárias, o fascínio pela linguagem mais coloquial, a das expressões populares e o apreço por um tipo de humor extremamente peculiar.

Cabrera Infante tece sua trama a partir de um encontro de Estelita com o narrador, critico de cinema da revista Carteles.




Existirão pontos comuns? Música, cinema e literatura são coisas dele. E Estelita , traz o quê? “Era sua própria personagem, sua protagonista e ao mesmo tempo sua antagonista sem angústia existencial.”

O narrador e Estelita, o brilhantismo da narrativa de Cabrera Infante estabelece conexões entre essas personagens tão distantes e ao mesmo tempo tão próximas. O que é de uma, já foi de outra. O que ora pertence a mais velha, um dia envolverá a jovem. “Destino é quando uma força irresistível tropeça com o objeto imóvel que você é. Destino também é desatino.”

A ninfa inconstante é um livro fascinante, no entanto, vale a pena anotar esse aviso, obediente leitor: é necessário um esforço tsunamico para não sucumbir no labirinto linguistico erguido por Cabrera Infante.


Guillermo Cabrera Infante (Gibara, Cuba, 22 de abril de 1929 - Londres, 21 de fevereiro de 2005) foi um escritor cubano naturalizado britânico. Além de ser romancista, contista e ensaísta, escreveu poemas visuais e roteiros cinematográficos.

Em 1949 criou o semanal Nova Geração (em espanhol Nueva Generación) e em 1950 ingressou na Escola de Jornalismo. Dois anos depois, após a aparição de um relato na Boehmia, foi preso. Nos anos seguintes não pôde finalizar seus trabalhos com seu próprio nome, e por isso usou um pseudônimo (G. Caín).

Obras:

• Contos-relato: Assim na Paz como na Guerra (1960) / A Vista do Amanhecer no Trópico (1974).

• Ensaios: Um ofício de sigilo XX (1960) / O (1975) / Exorcismo de estilo (1976) / Arcadia todas as noites (1978) / Holy smoke (1984) / "Mea Cuba" (esp.) (1993).

• Romances: Três tristes tigres (1965) / A Havana para um infante defunto (1980).



*Luíz Horácio Pinto Rodrigues - Natural de Quaraí, pequeno município gaúcho na fronteira com o Uruguai, é formado em Letras e faz mestrado na mesma área. Viveu sua juventude na terra natal e em Porto Alegre, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde se formou em Letras e passou cerca de vinte anos ali, escrevendo e colaborando com páginas literárias de várias publicações. Sua principal obra é a denominada Trilogia Alada, inaugurada com Perciliana e o pássaro com alma de cão, seguida de Nenhum pássaro no céu, e encerrada agora com Pássaros grandes não cantam.

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