quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Césares russos




De uma pequena fração de terra ao maior país do mundo, os czares fizeram a Rússia. Opulentos, autoritários e vingativos, eles criaram uma unidade nacional e governaram por mais de mil anos.

por Eduardo Szklarz




Os Romanov

Eram 2 da manhã quando Nicolau II foi despertado naquele 17 de julho de 1918. O último "imperador de todas as Rússias" agora era prisioneiro dos revolucionários bolcheviques numa casa de Ecaterimburgo, oeste do país. Nicolau foi conduzido com a mulher, o filho, as quatro filhas, o médico e os empregados para um quartinho dos fundos, onde 12 homens os esperavam com armas na mão. Depois do fuzilamento, o pelotão se assustou ao ver que as filhas continuavam vivas - as balas ricochetearam nas jóias costuradas em seus vestidos. O jeito foi terminar o "serviço" com golpes de baioneta.




Nicolau II

Era o fim dos 300 anos da dinastia Romanov. Era também o fim de quatro séculos de domínio dos czares - déspotas com autoridade ilimitada sobre cada um de seus súditos. Ao longo da História, líderes eslavos, sérvios e tártaros também receberam o título de czar (derivado dos "césares" de Roma), mas na Rússia ele adquiriu caráter especial. Usando uma mescla de terror e nacionalismo religioso, os czares russos transformaram um reino minúsculo numa potência mundial e expandiram seu território até ter o dobro do tamanho do Brasil.

Para alguns historiadores, porém, o czarismo não morreu com Nicolau II. Seus métodos autoritários prosseguiram na era soviética e ainda fazem a cabeça dos líderes do Kremlin.

Moscóvia




Riurík

A semente do czarismo foi plantada no século 9, quando o chefe viking Riurík fundou uma dinastia em Nov-gorod, no noroeste da atual Rússia. Seus descendentes ampliaram o reino até Kiev (Ucrânia), converteram-se à fé ortodoxa - ramo do cristianismo que rompeu com o catolicismo romano no século 11 e se espalhou nos domínios do Império Bizantino. Os descendentes de Riurík usaram o termo "Rus" para descrever seu povo e sua terra. No fim do século 12, o reino se fragmentou em principados rivais e as disputas favoreceram a invasão de Rus pelos tártaros - um povo turco muçulmano que pertencia ao império mongol.

"Os tártaros queimaram cidades e mataram milhares. Naquela época de intensa devoção, os russos pensaram que era um castigo divino", diz o historiador Ronald Hingley, da Universidade de Oxford. Os invasores pouparam o principado de Novgorod, com a condição de que seu príncipe, Alexandre Nevsky, lhes pagasse altos tributos. Foi quando tudo começou. Daniel, filho de Alexandre, tornou-se príncipe de um vilarejo chamado Moscou - e começou a anexar terras. As conquistas tiveram sinal verde dos tártaros, mais preocupados em incentivar as brigas entre os principados fortes. Em troca, os moscovitas obedeciam e pagavam impostos. Resultado: em sete décadas, o reino de Moscóvia cresceu oito vezes. Em 1326, desbancou Kiev como sede da Igreja Ortodoxa. Seus líderes adotaram o título de vseya Rusi ("de toda a Rus"), traduzido em geral como "de todas as Rússias". A essa altura, Moscou já fugia ao controle dos tártaros e criou um regime autoritário cujo príncipe, chamado de czar desde meados do século 15, governava com o apoio de uma facção aristocrática.

"A política de Moscóvia se parecia com a de Al Capone: para vencer os outros reinos, seus líderes tinham de ficar unidos e reconhecer o poder absoluto do príncipe. A crueldade e a unidade eram recompensadas, e os principais clãs se beneficiavam da expansão", diz Dominic Lieven, professor de História Russa na London School of Economics. "Sobre essa política de estilo gângster, a Igreja Ortodoxa carimbou um selo de aprovação." O czar contava com autoridade ilimitada pois seu poder emanava de Deus. A igreja se beneficiava do aumento do poderio russo, pois crescia dentro do cristianismo.

Nos 600 anos seguintes, o principado de Moscou cresceria até ocupar um sexto do planeta. E seus habitantes veriam na monarquia absoluta a única forma de evitar o caos.

A saga dos Ivãs



Ivã III

Talvez o czar moscovita mais eficiente tenha sido Ivã III. Em 43 anos de governo, ele explorou as rivalidades dos tártaros do mesmo jeito que eles tinham feito com os russos. Insuflou o nacionalismo entre o povo e quadruplicou o tamanho do reino. Depois festejou a glória ampliando a construção do Kremlin, a fortaleza que até hoje abriga o governo russo. Não foi à toa que ele ficou conhecido pela alcunha de Ivã, o Grande.


Com a conquista de Constantinopla (Bizâncio) pelos turcos, em 1453, Moscou se proclamou centro da cristandade e herdeira do Império Romano do Ocidente (Bizantino). "Moscou, a terceira Roma!", ouvia-se agora no Kremlin. Ivã III também inaugurou a prática de deportações em massa, que seriam usadas pela União Soviética. Sua crueldade seria mantida por seu filho Vassily III e passaria dos limites com seu neto Ivã IV - chamado também de "o Terrível."



Ivã IV

"Ivã IV integra o grupo de superlíderes russos ao lado de Pedro, o Grande, Catarina, a Grande, Lênin e Stálin", diz Hingley. "Todos aplicaram o terror em defesa de si e do regime. Mas enquanto Pedro, Catarina e Lênin se limitaram a objetivos políticos, Ivã IV e Stálin praticaram uma matança extravagante que desafia qualquer compreensão.

"O terrível rebento tinha só 3 anos ao ser escolhido czar, e por isso sua mãe assumiu o trono. Com a morte dela (supostamente envenenada), o país virou palco de lutas entre os boiardos, nobres proprietários de terras. Eles supervisionaram a criação de Ivã, maltratando-o a ponto de fazê-lo passar fome, o que não explica completamente a brutalidade do futuro príncipe. Para muitos pesquisadores, ele sofria surtos de paranoia.

Certo é que Ivã IV se casou com a princesa Anastácia em 1547, ano em que foi coroado oficialmente com o título de "Czar de Toda a Rússia" e ficou conhecido como "o primeiro czar". Seu reinado começou bem: ele derrotou os tártaros e expandiu seus domínios no leste até o mar Cáspio e a Sibéria, transformando Moscóvia num estado multiétnico. Após matar boa parte dos boiardos, vingando os maus-tratos que sofrera na infância, ele deu espaço político a pessoas comuns, como artesãos, professores e profissionais liberais, ao criar o Zemsky Sobor (Assembleia da Nação), que também reunia membros do clero e da nobreza. Mas a morte de Anastácia, também supostamente envenenada, em 1560, provocou um piripaque na cabeça do monarca. Ele prendeu seus conselheiros e abriu fogo contra o povo. O terror ficou a cargo da Oprichnina, um esquadrão de cavaleiros vestidos de preto e com carta-branca para matar quem quisessem. Ao contrário dos outros czares, Ivã IV presenciava as execuções e maquinava formas de morte. Em 1570, uma plateia em Moscou viu como ele e seus homens desmembravam e ferviam vítimas suspeitas de traição.

Ivã IV casou com outras seis mulheres sem se firmar com nenhuma, e ainda se meteu numa guerra suicida contra suecos, poloneses e lituanos. Queria obter acesso ao mar Báltico, mas acabou derrotado. Tanto deslize favoreceu outra invasão de Moscou pelos tártaros. Desavenças na família também causaram uma tragédia pessoal: num de seus ataques de fúria, o czar golpeou seu filho Ivã Ivanovich na cabeça com uma bengala de ferro, matando-o. Amargaria essa dor por toda a vida. O maior mistério em torno de Ivã IV foi sua enorme popularidade. Embora tenha matado mais camponeses que boiardos, ele seria lembrado na URSS como caçador de nobres. Não é à toa que Stálin gostava de comparar a Oprichnina com a polícia secreta soviética, a NKVD (depois KGB).

A era Romanov



Mikhail Romanov

Passado o furacão Ivã, os boiardos voltaram a brigar pelo poder, provocando uma época de devastação e pilhagens conhecida como "Tempo dos Problemas". A dureza só terminou em 1613, quando a Assembleia da Nação escolheu o novo czar: Mikhail Romanov - o primeiro de uma dinastia que duraria 300 anos.

Nenhuma dinastia dura tanto tempo sem intrigas. Foi assim com Pedro I e sua irmã Sofia. Como ele tinha só 9 anos ao ser coroado, em 1682, ela virou regente. Aos 17, Pedro viu que a irmã queria tirá-lo da jogada e, com o apoio da nobreza, confinou-a num convento. Assumiu com um grande objetivo: transformar a Rússia num Estado europeu moderno.

Assim, Pedro I organizou o Exército e a Marinha, estabeleceu relações com outros países e traduziu livros para o russo. Também derrotou os suecos em 1709 na batalha de Poltova.Ela marcou a conquista da supremacia russa no nordeste da Europa e a entrada do país no clube das grandes potências. Mais: Pedro I conquistou parte da Estônia e chegou à sonhada costa do Báltico - no extremo mais próximo ao restante da Europa. Lá fundou São Petersburgo e fez dela a capital da Rússia, deixando claro que o reino de Moscóvia era coisa do passado. Assim levava adiante seu projeto de aproximação da cultura europeia, que se refletiu na arquitetura da cidade. Ele acreditava que a formação da Rússia moderna deveria se guiar no modelo das nações europeias, o que causou uma grande cisão cultural no país. De um lado estavam os "ocidentalistas", que apoiavam Pedro; de outro, os "eslavófilos", que rejeitavam as reformas liberais e queriam resgatar o passado idílico, rural e autóctone russo. Além disso, a mudança da capital para São Petersburgo mergulhou a aristocracia em excessos palacianos nos moldes de Versalhes. Tudo isso contribuiu para o enfraquecimento da corte na Revolução de 1917.

Ao botar uma pá de cal em Moscóvia, Pedro proclamou o Império Russo e assim ganhou três títulos: imperador de toda a Rússia, grande pai da terra e Pedro, o Grande. Por trás de toda essa pompa, estava o aparato brutal de sua guarda militar, a Preobrazhensky. "A longa história da Rússia como uma burocracia terrorista começou de fato com o imperador", diz Hingley.

Ao contrário de Ivã IV, Pedro I era frio, racional. Foi assim que lidou com o rebelde mais famoso do reino: seu filho Alexis, que não aguentou as cobranças do pai e fugiu da Rússia, mas foi caçado. "Seu pai o matou a sangue-frio, ao contrário do surto que levou Ivã a matar o filho dele", afirma Hingley.

No fim das contas, o grande "modernizador" não se importou com os camponeses. Ao contrário: manteve-os na servidão, como meros objetos pertencentes ao Estado e aos nobres. Enquanto a elite russa se parecia cada vez mais com a europeia, a massa ainda vivia na Idade Média.

Catarina, a Grande




Catarina, a grande

Frederica Sofia era uma princesinha sem grandes chances de subir na vida. Seu pai era um dos tantos nobres decadentes da Prússia do século 18. Mas, aos 15 anos, a czarina Isabel a convidou para conhecer seu sobrinho, o príncipe herdeiro Pedro III, neto de Pedro, o Grande. Isabel achava que ela seria mais dócil que uma nobre de alta linhagem para se casar com o futuro czar. Ledo engano!

Para realizar a boda, Sofia se converteu à fé ortodoxa e passou a se chamar Catarina. Mas o casamento logo azedou. Além de obcecado pela disciplina prussiana, Pedro era imaturo e impotente. Ou estéril, como diziam os fofoqueiros da corte. Seja como for, os dois não se bicavam - e ela decidiu disputar o trono sozinha. "Catarina sabia que só seria aceita se parecesse russa. Passava noites aprendendo o novo idioma", diz Henri Troyat na biografia Catarina, a Grande.

Quando Pedro III assumiu o trono, Catarina sentiu o perigo: o marido a deixaria para se casar com outra. Mandou então seu amante Grigori Orlov, membro da guarda imperial, dar cabo do czar. O clero e a nobreza apoiaram o golpe e aclamaram a nova imperadora: Catarina II. Ela estabilizou o reino e conquistou prestígio entre os europeus. Também abocanhou terras da Turquia, coisa que nem Pedro, o Grande, havia feito.



Yemelyan Pugachov

Mas ai de quem criticasse seu governo. O escritor Alexandre Radishchev foi exilado na Sibéria. Já Yemelyan Pugachov, líder de uma rebelião dos cossacos, terminou esquartejado. E, quanto mais poderosa Catarina ficava, mais amantes ela tinha (leia quadro na pág. 30). "Em 1796, seu filho Paulo I a sucedeu disposto a reverter tudo o que a mãe havia feito. Os dois se odiavam", diz Troyat. De fato, Paulo anistiou Radishchev, prestou homenagens ao pai (Pedro III) e baixou regras prussianas. Por exemplo, proibiu o uso de chapéus redondos e ternos à francesa. Até hoje ninguém sabe quem mandou matá-lo, ou quem foi seu pai biológico. Só se sabe que seu filho Alexandre I, o neto querido e protegido da czarina Catarina, não perseguiu seus assassinos ao assumir o trono.


Gigante de papel


A Rússia entrou no século 19 cheia de contradições. Seus canhões causavam medo, mas seus 14 milhões de habitantes continuavam na miséria. Somariam 60 milhões em 1835, graças à anexação de terras - 95% deles viviam no campo. Era preciso modernizar o país, mas isso ameaçava o poder dos czares. Como dar liberdade ao povo sem perder o controle da nação?



Alexandre I

Esses foram os dilemas de Alexandre I, o czar que botou para correr as tropas do general francês Napoleão Bonaparte e desfilou triunfante em Paris. A vitória aumentou a autoestima russa, mas colocou as tropas em contato com as ideias da Revolução Francesa. Os oficiais voltaram para casa querendo um sistema constitucional. E os soldados, emancipação. Alexandre I até falou em reformas liberais, mas era tudo fachada. Sua maior preocupação foi consolidar a Rússia como peça-chave do Congresso de Viena - o pacto celebrado pelas potências europeias em 1815 para restaurar a monarquia após a derrota de Napoleão. Ao lado da Prússia e da Áustria, ele fundou a Santa Aliança para reprimir as revoluções no continente em nome da fé cristã.

A tarefa continuou com seu irmão Nicolau I, outro czar que sonhava transformar a Rússia em cão de guarda da Europa. Mas ficou só no sonho: várias revoluções surgiram em 1848 e puseram fim à Santa Aliança. Nicolau I foi derrotado por ingleses, franceses e turcos na Guerra da Crimeia - prova da fraqueza russa. Faltava tudo, de locomotivas a munição. E faltava acabar com a servidão. Foi o que fez Alexandre II, filho de Nicolau I. "Ele libertou mais escravos que o presidente americano Abraham Lincoln, e sem guerra civil no meio", diz Hingley. Mas as mudanças só jogaram mais água no caldeirão revolucionário. Os socialistas diziam que os libertos viraram escravos da burguesia. Alexandre II escapou de vários atentados até que, em 1881, foi dilacerado por uma granada caseira.

O fim





Alexandre III


Não era fácil ser czar no século 20. Alexandre III sabia que não repetiria as façanhas de seus antepassados. Ele bem que tentou reviver a trilogia "autocracia, ortodoxia e nacionalismo", mas em vão. Pouca gente ainda aceitava que a vontade do czar era a vontade de Deus. E outra: insuflar o nacionalismo num império multiétnico, onde apenas 46% dos habitantes eram russos, apenas acionou uma bomba-relógio. Enquanto o movimento revolucionário crescia, os monarcas culpavam os judeus pela crise e matavam milhares nos pogroms, massacres em pequenos vilarejos de israelitas. Entre 1880 e 1920, cerca de 2 milhões de judeus russos emigraram para as Américas fugindo dessas perseguições.


A hora da implosão estava perto. Em 1904, a Rússia cambaleou numa guerra contra o Japão. Em 1905, centenas de manifestantes morreram ao exigir liberdade em São Petersburgo - num dia lembrado como Domingo Sangrento. Em 1917 não teve jeito: Nicolau II abdicou. Foi fuzilado por ordem de Vladimir Lênin, líder dos bolcheviques. Era a vez deles de derramar sangue. A URSS impôs uma nova ideologia, mas manteve a velha lógica: quanto mais inocentes matasse, menores as deserções e maior a certeza de que todos marchariam rumo à vitória final. Durou 70 anos. Hoje, especialistas veem ares de czar no ex-KGB, ex-presidente e atual primeiro-ministro russo Vladimir Putin. "A Rússia abraçou outra vez o czarismo por várias razões. O país tem longa tradição de um poder indivisível e quase sagrado. A democracia é um conceito negativo no imaginário popular, sinônimo de um pode-tudo onde só os ladrões prosperam. Além disso, a maioria das pessoas associa estabilidade com um líder forte", diz Dmitri Trenin, ex-oficial do Exército russo e diretor do Centro Carnegie de Moscou.O Kremlin exerce controle cada vez maior sobre as TVs e o Parlamento, enquanto jornais estão sendo comprados por empresários amigos do governo. Coisas de czar...

Os amantes de Catarina

A czarina era ninfomaníaca e não podia viver nem uma hora sem amor


Grigori Potiomkin

Ter amantes era uma prática comum na corte imperial russa. Mas Catarina II foi insuperável. Aos 23 anos, depois de oito sem dividir a cama com o marido, Pedro III, ela conheceu os prazeres da carne com o jovem Sergei Saltikov. "Ele era lindo como o dia", escreveu Catarina em suas memórias, dando a entender que o mancebo era o pai de seu filho, Paulo I. Saltikov se cansou da imperadora, mas muitos outros viriam. "Minha desgraça é que meu coração não pode se contentar nem uma hora se não tem amor", ela confessou em seu diário. Sorte de Estanislao Poniatowski, um virgem de 23 anos enviado pelo embaixador inglês. Foi o brinquedinho de Catarina, que passou a gastar fortunas com seus amantes. De todos, o mais poderoso foi o tenente Grigori Potiomkin. Ele influía nas decisões da czarina, e talvez tenha sido o único que ela amou. "Potiomkin vivia no palácio. Só precisava dar dois passos, subir uma escada e já estava no aposento real. Chegava desnudo por baixo da bata", diz o biógrafo russo Henri Troyat. Quando o sexo esfriou, Potiomkin passou a selecionar os novos "favoritos".

Ser "favorito", aliás, era uma profissão. O sujeito recebia salário, e quando deixava de agradar era indenizado com terras, rublos e escravos. "Em seguida, abandonava discretamente seus aposentos, enquanto Potiomkin escolhia o substituto", diz Troyat. "O novo candidato era examinado por um médico e depois submetido a uma prova íntima com uma condessa, que passava um relatório a Catarina. Só então ela tomava a decisão."

Revolta dezembrista

Mal-entendido provocou levante popular com consequências trágicas

Revolta Dezembrista

O império russo viveu uma bela trapalhada em 1825, e tudo por causa de um mal-entendido. Naquele ano, o czar Alexandre I morreu sem deixar herdeiro direto. Quem devia então assumir o trono era seu irmão Constantino I, vice-rei da Polônia. Mas Constantino não queria saber de ser rei. Havia firmado um manifesto no qual transferia esse direito ao irmão mais novo, o belicoso Nicolau I. O problema é que ninguém sabia do documento, cujas cópias ficaram mantidas em segredo no Senado e no Santo Sínodo (cúpula ortodoxa). "Nicolau ignorava o manifesto e jurou fidelidade a Constantino.

Só uma renúncia oficial do irmão poderia fazê-lo assumir", diz o biógrafo russo Henri Troyat. Assim, enquanto Constantino demorava para se pronunciar, Nicolau ficava sem ação, sabendo que era mais impopular que o irmão. Quando Nicolau finalmente assumiu, as tropas do Exército já tinham jurado lealdade a Constantino.Foi no meio dessa sinuca que eclodiu uma revolta em São Petersburgo. Os líderes eram oficiais que queriam instaurar uma monarquia constitucional nos moldes europeus, e achavam que era seu dever defender Constantino contra o irmão. Em 14 de dezembro, milhares de revoltosos se uniram ao levante e invadiram a praça do Senado. Com armas na mão e vodca na cabeça, eles gritavam a favor de Constantino e da Constituição. "Alguns achavam que a Constituição era mulher de Constantino", afirma Troyat. Mal liderados, os rebeldes não avançaram para tomar o poder. Tampouco obedeceram as ordens de Nicolau de cair fora da praça. O czar ordenou que se abrisse fogo contra a multidão, resultando em dezenas de mortos (talvez mais), 3 mil presos, cinco enforcamentos e centenas de exilados na Sibéria. Tudo por culpa de um mal-entendido.

Ovos Fabergé
Joia personalizada era ofertada na Páscoa no lugar do ovo tradicional


Entre os objetos que simbolizam a opulência dos czares russos, nenhum é tão rico em detalhes e surpresas quanto os ovos de Fabergé. Fabricados pelo ourives que deu nome às peças, eram verdadeiras joias em formato ovalado. A história começa quando o czar Alexandre III quis surpreender sua esposa, a czarina Maria Feodorovna, na Páscoa de 1885. Um dos rituais dos seguidores da Igreja Ortodoxa era trocar ovos na celebração da reencarnação de Cristo, como se faz em todo o mundo católico, nos dias de hoje. Mas antigamente os ovos eram de galinha mesmo, e não de chocolate. O detalhe era adorná-los com pinturas. Quando o czar encomendou um ovo de ouro, a Páscoa da dinastia Romanov nunca mais foi a mesma. A cada ano, Fabergé fabricava um ovo mais caprichado, elaborado com esmalte, metais e pedras preciosas. Os ovos sempre continham surpresas em seu interior, que às vezes recontavam episódios da história russa e conquistas do exército ou reproduziam grandes obras arquitônicas. Em 2007, um exemplar foi leiloado por 18,7 milhões de dólares.

Saiba mais
LIVROS
Russia, a Concise History, Ronald Hingley, Thames and Hudson, 1972.
O professor de Oxford relaciona o czarismo com outros períodos da história russa.
Catalina, la Grande, Henri Troyat, Ediciones B, 2005.
Biografia com detalhes sobre a vida pública e privada da imperadora.
Nicolás II, Dominic Lieven, El Ateneo, 2006.
Um livro sobre o último czar que acaba sendo uma bela análise de toda a era czarista.
Fonte: Revista História-No. 071
Imagens: Internet

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

O RASTRO DO JAGUAR



Hoje não tem introdução, vamos direto, curioso leitor. O livro é extenso 565 páginas, o livro é premiado, prêmio Leya 2008, o autor é experiente, mas o livro é “quase”. Quase bom, quase repetitivo, quase entediante, quase uma aventura, quase previsível. Deve muito a Tristes Trópicos-Lévi Strauss- e deve um pouco a Trevas no Eldorado-Patrick Tierney e outro pouco a Os sertões-Euclides da Cunha. O enredo é simples, mas a tentativa de torná-lo complexo o transformou numa trama previsível. Tudo isso embalado pelo sentimentalismo sempre exagerado da música de Wagner. Isso é opinião, você não é obrigado a aceitar tampouco concordar. Respeite e estamos conversados, educado leitor.

A trama é a seguinte: véspera do ano novo de 1900, Pereira, velho jornalista de origem portuguesa , começa a desfiar suas memórias que chegam da metade do século XIX.Conta que saiu de Paris junto com Pierre. O jornalista/narrador pretende apresentar o Brasil que nessa época está em guerra com o Paraguai. Detalhe; o Brasil não está só nessa “dificílima” empreitada. Ajudarão no massacre Argentina e Uruguai.


O rastro do jaguar é a história de Pierre, soldado francês de origem guarani, que vem ao Brasil em busca de suas raízes, pano de fundo a colonização dos índios.


O que me proponho a escrever não são minhas memórias, não é um romance; será, talvez, uma longa reportagem sobre a história de várias guerras, grandes e pequenas, que acompanhei ao longo desta vida de repórter. Mas principalmente sobre a viagem de um homem em busca de sua alma e de seu povo.Esse homem se chamou Pierre de Sanit’Hilaire, foi soldado, músico, poeta e mais tarde transformou-se no Jaguar, o Iauaretê das paradarias do Sul.

Pierre não é pouca coisa, guarani, formou-se na Europa, músico erudito, tocou na estréia do Tannhäuser , dramalhão wagneriano,em Paris. Seria Pierre o nosso outro “índio de casaca”? Apelido que Menotti del Picchia deu a Villa Lobos.


A busca de Pierre se desenvolve em quadros pintados com as tintas da melancolia, a leitura de cartas antigas vai deixando à mostra a quantidade incompleta de peças de um quebra-cabeças . Gravados nessas peças as incursões das personagens e um capítulo da história do Brasil do século XIX.

As veredas de Pierre e Pereira começam pelo sertão, é lá que eles percebem a resistência dos nômades botocudos. Esses aimorés não se rendem ao colonizador, não abandonam seus hábitos nômades, tais atitudes os encaminham a um fim deplorável.

Pierre, você logo perceberá isso, arguto leitor, encontrará sua gente e a seguir se ocupará com os mitos de sua gente. O mito que não exige dissociação entre ser e natureza, tudo se confunde, o eu e a natureza são uma coisa só. Nossa sociedade atual, massificadora opera nessa mesma faixa, provocando a perda das individualidades. O indivíduo acompanha a vontade das massas. Bem, mas isso é assunto para outra hora.

Voltamos a seguir o rastro do Jaguar. Ao mergulhar nos mitos criadores de seu povo, Pierre tem atenção despertada pela existência de uma Terra Sem Males. E Pierre parte...

Não importava que o Norte os levasse ao coração do Império - nada limitaria a caminhada em busca da Terra Sem Males.

- Por quê? Porque assim nossos antepassados nos mandaram; porque assim continuaremos vivos, assim teremos a esperança. Até onde iremos? Não é possível saber o destino antes de começar a caminhar. Haverá, em algum lugar, um vale pequeno onde nossa gente poderá abrigar-se, silenciosa, aguardando seu futuro.

O rastro do Jaguar tem alguns pontos em comum com Trevas no Eldorado, entre eles o massacre dos índios. Na obra de Tierney percebemos as ações criminosas de cientistas e jornalistas. O rastro do Jaguar, por sua vez, traz a reportagem da Guerra do Paraguai.



Argentinos, Brasileiros e Uruguaios se uniram para combater as tropas de Solano Lopez que contava em suas fileiras com vasto contingente de guaranis paraguaios. Dizimados, é claro.

O rastro do Jaguar enquanto aventura, aventura de índios, lutas,selvas, radiografia da colonização, da nefasta contaminação religiosa/ideológica tem lá seus méritos. Do caráter antropológico não convém tratar, Tristes Trópicos ainda vale leituras e releituras infindáveis. No quesito reportagem, o obra de Murilo Carvalho fica bastante aquém de Os Sertões, inclusive no que diz respeito a aventura, ao quase faroeste tupiniquim que ele e Euclides da Cunha escreveram. Desse modo, concluo que a floresta seja o terreno por onde Murilo de Carvalho melhor conduz sua narrativa e seus personagens. Embora seus personagens sejam de uma firmeza psicológica assustadora, buscar aproximações com a realidade não é tarefa das mais fáceis. Tem um quê daquelas construções idealizadas, o índio de José de Alencar e suas façanhas. Murilo tem resquícios de um romantismo que compromete. Vale ressaltar o olhar critico do autor no que diz respeito a moral vigente no Brasil pós-colônia, onde negros e índios eram tratados como “bois de piranha”. Os Farrapos, Gal. Canabarro enviou os lanceiros negros, armados com lanças e nada mais, a enfrentar as balas. Viraram nomes de ruas e avenidas os “anjos Caxias, Canabarro, Borges de Medeiros, et. Caterva. Feito o desvio, voltemos ao rastro do Jaguar.


Caxias

Gal. Canabarro

Ao ingressar no cenário urbano os aspectos de gosto duvidoso se tornam mais evidentes. Na viagem da floresta para a Europa, Murilo esquece algumas coisas e acrescenta outras, entre elas a pieguice e os lugares comuns. A história de amor de Pereira, o narrador, é constrangedora em seus exageros nostálgicos. Mas Murilo não deixa a pieguice de lado quando o cenário é a floresta, não embarque nessa canoa, ingênuo leitor. Atente para o trecho onde o narrador se refere a poesia de Gonçalves Dias.

Hoje, depois de tantos anos, percebo como ele estava errado;seu romantismo não era exagerado;as virtudes como honestidade, honra, coragem, lealdade, amor, que ele colocava romanticamente, nos personagens de seus poemas, existiam sim entre os índios brasileiros.
Isso posto, vale acrescentar mais um quase a O rastro do Jaguar , o quase épico.O quase épico que não enaltece feito algum, o quase épico a apresentar desastres e mais desastres culturais.
E de Wagner, a influência maior que se nota não vai além dos absurdos sentimentais.

TRECHO

Hoje, relendo o poeta Gonçalves Dias, não apenas este poemas, mas outros versos em que fala da nobreza, do amor, dos grandes sonhos que nascem nas noites da floresta, posso compreender ainda com mais clareza as decisões de Pierre e também por que seu povo passou a chamá-lo de Jaguar, o grande tigres das florestas americanas, solitário, valente e poderoso. O Jaguar, cujo rastro venho seguindo, para que eu mesmo possa ter certeza de que a honra e a lealdade são os valores que levarei comigo desta vida de aquém-túmulo.

É estranho como sempre que se discute algum aspecto da vida moral, como a honra, a bondade, a solidariedade, muita gente se indague sobre sua utilidade. Nestes anos em que o positivismo tornou-se quase uma doença que ataca a maioria dos homens que governam os países, fazendo-os enxergar na ordem e no ordenamento das idéias a base de toda a felicidade e do progresso das nações, é comum buscar uma utilidade para cada coisa.Assim, a ordem, o progresso seriam aplicações úteis das idéias, como a ordem unida e os exercício físicos são pressupostos da formação de bons soldados. Nada mais errado. A experiência do pensamento e a convivência com a cultura não lógica, como a dos índios brasileiros, têm me mostrado que o bem moral não é útil; ele é, na verdade, uma forma de realização harmônica do ser humano, porque coloca o homem no plano real da liberdade à medida que sua vida toma o rumo que ele deseja, ao fazer a escolha entre uma vida moral e uma vida baseada no útil.

AUTOR

Murilo Carvalho é jornalista, escritor e realizador de documentários.Trabalhou em alguns dos principais jornais e também em revistas e em emissoras de televisão brasileiras.
Durante os anos de ditadura militar no Brasil foi repórter do jornal Movimento. Trabalhou ainda no jornal Folha de São Paulo e em revistas da Editora Abril. Nos últimos anos,dedicou-se à produção de documentários e programas de televisão sobre a realidade brasileira.



RESENHISTA
Luíz Horácio Rodrigues, jornalista, escritor, autor dos romances "Perciliana e o Pássaro com Alma de Cão", ed.Conex.2006 e "Nenhum Pássaro no Céu", ed. Fábrica de Leitura, 2008. Professor de Literatura, mestrando em Letras.







Imagens: Internet

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Émile Zola- entre a genialidade e a justiça

A fama do escritor francês veio não só de suas obras como também de seu empenho em defender a absolvição de um condenado, desafiando a justiça e a política de sua época.





por Henri Mitterand

Junho de 1908. Os restos mortais de Émile Zola são levados ao Panthéon. Um fanático nacionalista e anti-semita, Gregori, dispara contra o comandante Alfred Dreyfus e o fere no braço. As brasas do caso Dreyfus não estão extintas, os velhos rancores permanecem vivos. Em 29 de setembro de 1902, a morte de Zola, por asfixia em seu apartamento da rue de Bruxelles, fora talvez a conseqüência de um atentado. Três teses se contrapuseram a esse respeito: a da investigação oficial, que concluiu por um acidente, a de uma investigação particular feita em 1952, que apoiou em testemunhos indiretos a hipótese de um ato criminoso, e uma outra, recente, do comissário Marcel Leclère, que se inclinou pela hipótese de uma morte involuntária, resultante de erro. Em 30 de setembro de 1902, La Libre Parole, jornal do líder anti-semita Drumont, dizia na manchete de primeira página que Zola havia sido asfixiado. Alguns choraram, outros aplaudiram. Zola era então, e desde muito tempo, objeto de admirações incondicionais e de ódios irreconciliáveis; literários, morais, políticos. Ele jamais detestou isso.

Émile Zola nasceu em 10 de abril de 1840, no coração de Paris, filho de um engenheiro de origem veneziana, Francesco Zola, e de Emilie Aubert, natural da região da Beauce, 24 anos mais jovem que o marido. François Zola construiu em Aix-en-Provence a barragem e o canal Zola. Morreu em 1847 das seqüelas de um resfriado. Seu filho, órfão aos sete anos, viveu em Aix até perto dos 17, enfrentando dificuldades cada vez maiores, pois a família foi enganada pelos homens que se apoderaram da empresa do canal Zola. É assim que se formam os revoltados. No colégio Bourbon de Aix-en-Provence, ele teve como companheiro mais próximo Paul Cézanne, filho de um banqueiro, que sonhava em pintar com o mesmo ardor com que ele sonhava em escrever. Encontro extraordinário de dois garotos que lançariam por terra todas as convenções da arte. Quando Zola "subiu" para Paris, em fevereiro de 1858, foi um rude golpe em uma amizade que ainda se prolongaria por quase 30 anos.

Aluno do liceu Saint-Louis, ele fracassou no exame de conclusão do ensino médio em 1859. Estava mais interessado no espetáculo da cidade, revirada e reconstruída pelos pedreiros de Haussmann, do que nas aulas. Ele não insistiu. Seguiram-se três anos de vida boêmia nos alojamentos a preço módico da colina Sainte-Geneviève. Zola perambulava, vagava pelos ateliês de pintura na companhia de Cézanne, leu todos os clássicos e todos os românticos e compôs milhares de versos, pois se imaginava poeta. No decorrer do inverno de 1860-1861, teve um relacionamento com uma mulher tão pobre quanto ele. Chamava-se Berthe, é tudo que se sabe a seu respeito. Ela passava de amante em amante, levando ao desespero seu poeta famélico. Eles se separaram. Talvez ela tenha libertado o verdadeiro gênio de Zola, que voltou as costas à elegia romântica e se inscreveu na rude escola do real. Seu primeiro romance, La confession de Claude, em 1865, fez a transposição de sua aventura.


Fim do período boêmio. Em março de 1862, uma recomendação o fez ingressar na Librairie Hachette, famosa editora francesa. Zola agarrou com as duas mãos a chance que passava. Encarregado da publicidade e da distribuição dos livros à imprensa, atendia ao mesmo tempo editores, escritores e jornalistas, o que lhe permitiu organizar rapidamente uma valiosa agenda de endereços. Lendo os autores da Hachette e das outras editoras, educou-se como livre-pensador. Aos 25 anos, crítico literário, cronista e logo crítico de arte, afirmava bem alto sua admiração pelos escritores e artistas que desafiavam o conformismo: os Goncourt, Flaubert, Courbet, Manet. Enquanto todos os críticos oficiais cobriam de injúrias o pintor de Déjeuner sur l'herbe e de Olympia, ele bradou em L' Evénement: "O lugar do sr. Manet é no Louvre!"



Retrato de Zola (Manet)


Seguiram-se alguns anos difíceis. Zola deixou a Hachette, no início de 1866, para viver exclusivamente de sua pena, de um pequeno jornal a outro, produzindo na base de um romance por ano. Ora, o pagamento dos textos era irregular e os romances não davam retorno. Ele tinha a seu encargo a mãe e a mulher, Alexandrine. Felizes os escritores que tinham boas rendas, como Flaubert e os Goncourt. Zola estava o tempo todo contra a parede.

Paradoxalmente, foi o Império que o livrou das dificuldades. Em maio de 1868, Napoleão III liberalizou o regime da imprensa. Os jornais oposicionistas surgiram como cogumelos depois da chuva. Zola ingressou em La Tribune, onde atuou durante dois anos. Por meio de amigos de Victor Hugo, teve abertas as colunas do Rappel, mais ferozmente republicano que La Tribune. A abdicação de Napoleão III o preservou no último instante de uma condenação por estímulo ao menosprezo pelo governo. A propaganda democrática o alimentava, e ele não pedia mais do que isso. Mas o que fazer em uma Paris atacada pelo exército prussiano, durante a Guerra Franco-prussiana (1870-1871)? Em 7 de setembro de 1870, os Zola conseguiram embarcar em um dos últimos trens que deixaram a estação de Lyon. Passariam o fim da guerra em Marselha, onde Zola fundou um jornal hoje desaparecido, La Marseillaise, e depois em Bordeaux, onde ele se fez contratar como cronista parlamentar de La Cloche. Cada vez que, no decorrer desses cinco anos, o solo ameaçava afundar sob ele, Zola retomava pé com uma rara habilidade tática e com um desprezo crescente pelo pessoal político.

Uma ferida na honra francesa


por Raphaella de Campos Mello

Em 1894, o judeu Alfred Dreyfus, oficial do exército francês, foi acusado de ser um suposto informante a serviço do governo alemão. O crime foi enquadrado como alta traição e o acusado sofreu um processo fraudulento conduzido a portas fechadas. A farsa foi acobertada por uma feroz onda de nacionalismo e xenofobia que invadiu a Europa no final do século XIX. Dias soturnos já avistados em 1886, com o lançamento do panfleto anti-semita de Édouard Drumont intitulado A França judia.





A perseguição ao oficial começou quando Madame Bastian, encarregada da limpeza na embaixada alemã em Paris, descobriu uma carta no cesto do lixo do adido militar alemão, o tenente-coronel Schwarzkoppen. O achado caiu nas mãos do serviço secreto francês, que concluiu ser o escrito a prova da existência de um traidor entre o corpo militar. Um bode expiatório fez-se necessário. Seu nome: Alfred Dreyfus, condenado à prisão perpétua na ilha do Diabo, na costa da Guiana Francesa.




Em 1898, evidências de sua inocência possibilitaram um segundo julgamento. Mais uma encenação. A permanência da sentença anterior provocou a indignação de Émile Zola, peça-chave da campanha pelo indulto do militar injustiçado. Zola fez excelente uso do único meio de mobilização da opinião pública na época: a imprensa escrita. Seu golpe de mestre veio em 1898, com a publicação de J'Accuse, a célebre carta aberta ao presidente da República Félix Faure, publicada pelo jornal L'Aurore.

Indignado, o escritor endereça uma reprimenda à França: "Como poderias querer a verdade e a justiça, quando enxovalham a tal ponto todas as tuas virtudes lendárias?". A polêmica agrupou os franceses em duas frentes de batalha: os dreyfusards e os anti-dreyfusards. Provocador da balbúrdia, Zola foi condenado a um ano de prisão por difamação. Resolvido com o exílio de um ano na Inglaterra.

Charles-Ferdinand Walsin Esterhazy, major do exército francês, foi o verdadeiro autor da carta, desmascarado, em grande parte, graças aos esforços de Zola. Infelizmente, Zola, não assistiu à revisão do processo, que promoveu a reabilitação do oficial em 1906.



Morte de Zola


Túmulo de Zola



Émile Zola morreu vítima de intoxicação de monóxido de carbono proveniente de um fogão de lenha, a 28 de Setembro de 1902.


Resumo de Germinal (Considerado sua obra-prima)


Amplamente considerada a obra máxima de Émile Zola, Germinal (1885) elevou a estética e a descrição naturalistas a um novo patamar de realismo e crueza. O romance é minucioso ao descrever as condições de vida subumanas de uma comunidade de trabalhadores de uma mina de carvão na França. Após ter contato com idéias socialistas que circulavam pela classe operária européia, os mineradores retratados na obra revoltam-se contra a opressão e organizam uma greve geral, exigindo condições de vida e trabalho mais favoráveis. A manifestação é reprimida e neutralizada, entretanto permanece viva a esperança de luta e conquista.

Para compor Germinal, o autor passou dois meses trabalhando como mineiro na extração de carvão. Viveu com os mineiros, comeu e bebeu nas mesmas tavernas para se familiarizar com o meio. Sentiu na carne o trabalho sacrificado, a dificuldade em empurrar um vagonete cheio de carvão, o problema do calor e a umidade dentro da mina, o trabalho insano que era necessário para escavar o carvão, a promiscuidade das moradias, o baixo salário e a fome. Além do mais, acompanhou de perto a greve dos mineiros.

Bibliografia

Poesia
·
Messidor (1898)
L'ouragan (1901)

Romances e Novelas
·
Contes à Ninon (1864)
La confession de Claude (1865)
Madeleine Férat (1868)
Le vœu d'une morte(1866)
Les mystères de Marseille (1867)
Thérèse Raquin (1867)
Nouveaux contes à Ninon (1874)
Les soirées de Médan (1880), em colaboração com Maupassant, Huysmans, Léon Hennique, Henri Céard e Paul Alexis.
Madame Sourdis (1880)
Le capitaine Burle (1882)
Naïs Micoulin (1884)
A saga dos Rougon-Macquart
A fortuna dos Rougon - La fortune des Rougon(1870)
O regabofe - La Curée (1871)
O ventre de Paris - Le ventre de Paris (1873)
A conquista de Plassans - La conquête de Plassans (1874)
O crime do padre Mouret - La faute de l'abbé Mouret (1875)
O senhor ministro - Son excellence Eugène Rougon (1876)
A taberna - L'assommoir (1876)
Uma página de amor - Une page d'amour (1878)
Nana (1879)
A roupa suja - Pot-Bouille (1882)
O paraíso das damas - Au bonheur des dames (1883)
A alegria de viver - La joie de vivre (1884)
Germinal (1885)
A obra - L'ouvre (1886)
A Terra - La Terre (1887)
O sonho - Le rêve (1888)
A besta humana - La bête humaine (1890)
O dinheiro - L'argent (1891)
A derrocada - La débâcle (1892)
O doutor Pascal - Le docteur Pascal (1893)

A série das Três cidades
·
Lourdes (1894)
Rome (1896)
Paris (1898)

A série dos Quatre Evangelhos
·
Fécondité (1899)
Travail (1901)
Vérité (publié en 1903, após a morte do autor)

Peças de teatro
·
Thérèse Raquin (
1873)
Les héritiers Rabourdin (1874)
Le bouton de rose (1878)
Poèmes lyriques
Obras críticas
Mes haines (1866)
Le roman expérimental (1880)
Une campagne (1880-1881) (1882)
Nos auteurs dramatiques (1881)
Les romanciers naturalistes (1881)
Le naturalisme au théâtre (1881)
Documents littéraires (1881)
Nouvelle campagne (1896)
La vérité en marche (1901)

Fontes:

Henri Mitterand é professor emérito na Sorbonne Nouvelle. Publicou numerosos textos sobre a obra de Zola e sobre os romancistas dos séculos XIX e XX.

http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/emile_zola-_entre_a_
genialidade_e_a_justica.html

http://www.netsaber.com.br/resumos/list_autores_l_e.html

http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%89mile_Zola


Imagens: Internet

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Aisha - A favorita do profeta Maomé - uma relação de ciúmes e traição.

Entre as 13 esposas de Maomé, Aisha era a predileta. Ciumenta e inteligente, seus relatos da vida conjugal viraram modelos de conduta e influenciaram a tradição muçulmana


por Adriana Maximiliano

Aisha bint Abu Bakr tinha 6 anos e estava se divertindo num balanço, no quintal, quando soube que ia se casar. A mãe da menina deu a notícia e avisou que, a partir daquele dia, estava proibido "brincar fora de casa". O futuro marido era o melhor amigo do seu pai e tinha 51 anos. Em uma cerimônia sóbria, na casa da família da noiva, em Medina, Arábia Saudita, a união foi oficializada em 623 d.C. Ela contava 9 anos e se tornava a terceira mulher de Maomé, o criador do islamismo. Foi, para sempre, a preferida do seu harém. Quando perguntaram ao profeta a quem mais amava no mundo, ele foi direto: Aisha. Nos braços dela, morreu nove anos depois, e no quarto da favorita foi enterrado.
A vida de Aisha é tema de um polêmico romance lançado na Europa e nos Estados Unidos, The Jewel of Medina, da norte-americana Sherry Jones. A editora Random House desistiu da publicação, após ameaças terroristas, e a casa da dono da Gibson Square, Martin Rynja, que insistiu na iniciativa, sofreu uma tentativa de incêndio. Os críticos consideraram o livro uma piada de mau gosto. Sherry desenha Aisha como uma menina ocidental do século 21, caída de paraquedas no colo de Maomé.




Aisha e Maomé

Mas o que se sabe realmente sobre a história dessa jovem? Segundo uma das principais biógrafas das esposas de Maomé, Nabia Abbott, a menina e o profeta costumavam tomar banho juntos e até brincavam de boneca. Foi ao lado dela que ele teve a maior parte de suas revelações, as verdades fundamentais que iriam compor o Corão. E a própria Aisha contou que Maomé gostava de rezar com a cabeça recostada em seu colo, enquanto suava vigorosamente e ouvia sinos tocar. Embora sejam escassos os registros sobre a aparência física da jovem, provavelmente de cabelos e olhos castanhos, como a maioria das moças árabes, os textos apontam pelo menos uma diferença entre Aisha e as outras 13 esposas (e duas concubinas): era a mais jovem e foi a única a casar virgem.

Mel e ciúme





O casamento com crianças era comum na época e Aisha jamais se lamentou. Pelo contrário, era possessiva e ciumenta. Uma vez, armou um plano para afastar o marido de sua quarta esposa, Hafsa, com quem ele andava se demorando mais do que o costume. O profeta adorava doce e Hafsa havia ganhado um pote de mel, verdadeiro motivo das atenções especiais que vinha recebendo. Aisha, então, chamou outras duas esposas, Sawda e Safiyya, e combinou que todas deveriam reclamar do hálito do esposo e culpar a alimentação das abelhas pelo cheiro ruim. Deu certo. Ele ficou cismado e não quis mais o mel de Hafsa.





Mas o que assombrava mesmo Aisha era o fantasma de Khadija bint Khouweylid, a primeira esposa de Maomé, rica, mais velha que ele e morta três anos antes do casamento da menina. Roía-se de ciúme porque o marido fora fiel a Khadija, que, por sua vez, o ajudara a fundar o islamismo. Foi para ela que ele primeiro contou sobre a visão do anjo Gabriel. Tiveram seis filhos - dois meninos, que morreram, e quatro meninas. Maomé seria pai somente mais uma vez, com uma de suas concubinas - mas o menino, Ibrahim, também morreria na infância.



Um mês depois da morte de Khadija, no ano 619, Maomé decidiu se casar de novo, por sugestão de uma tia, Khawla bint Hakin. Ela também sugeriu opções de noiva: "Se quiser uma virgem, [case] com Aisha, filha de seu amigo Abu Bakr. Se quiser uma não-virgem, com Sawda". Viúva vinda da Abissínia, a segunda indicação da tia do profeta aceitou de pronto o pedido, e eles se casaram.

Abu-Bakr, que era então o mais importante aliado de Maomé, também concordou em ceder a filha. Mas Aisha estava prometida a outro e era necessário desfazer o compromisso. Foi fácil. Os pais do menino eram cristãos e cancelaram o trato com alívio. Assim, começaram as visitas diárias do novo pretendente à namorada.

A união aconteceu logo depois da mudança de Meca para Medina, fugindo da perseguição dos judeus. Chamado de hégira, o êxodo de Maomé e de seus seguidores inaugurou o islamismo, em 622 da era cristã. A fuga deu início ao calendário maometano e fim à infância de Aisha. “Nenhum camelo ou ovelha foi sacrificado no meu casamento”, contaria ela. Todas as atenções estavam concentradas em consolidar a nova religião.


O Alcorão


Em Medina, ele construiu apartamentos de tijolo para cada uma das esposas. O local onde ficava o de Aisha, hoje, é a Mesquita de Medina. Ninguém imagine um palácio. “Os apartamentos das mulheres de Maomé eram tão pequenos que mal se podia ficar de pé dentro deles. Ele não tinha casa. Passava cada noite com uma esposa e o apartamento dela virava a sua residência durante o dia”, escreveu Karen Armstrong no livro Muhammad: a Prophet for our Time (“Maomé: um profeta para o nosso tempo”), sem edição em português.

Divórcio coletivo



Meca

Fora Aisha e Khadija, todas as mulheres de Maomé eram viúvas de aliados, que ele desposou para não deixá-las desamparadas. A menina, diferentemente, não foi escolhida por conveniência. E seus privilégios logo ficaram evidentes. Assim que Aisha entrou na vida do profeta, ele passou a evitar Sawda, que, com medo de ser abandonada, cedeu à rival seu dia (e noite) com o marido, garantido por direito. A história inspirou o versículo 128 da surata (capítulo) do Corão: “Se uma mulher notar indiferença ou menosprezo por parte de seu marido, não há mal em se reconciliarem amigavelmente, porque a concórdia é o melhor, apesar de o ser humano, por natureza, ser propenso à avareza”.

Os textos da Suna, código de ética islâmico, do século 8, também destacam o favoritismo. “A superioridade de Aisha em comparação às outras mulheres é como a do tarid [um prato de pão e carne que ele adorava] em relação a outros tipos de comida. Muitos homens alcançam esse nível de perfeição, mas nenhuma mulher o conseguiu, exceto por Maria, filha de Imran, e Asia, a mulher do Faraó”.

A preferência, contudo, nunca significou exclusividade. Quando Aisha perguntou ao profeta quem seria a sua mulher no paraíso, ele avisou: “Você será uma delas”. E, numa crise entre as esposas, ele até ameaçou se separar de todo o harém: ou as mulheres aceitavam suas condições ou ia pedir o divórcio. Diversas versões explicam a medida drástica. Segundo uma delas, Aisha e Zeinab bint Khuzainah, a quinta esposa, começaram uma disputa por animais abatidos. Outra versão diz que a quarta esposa, Hafsa, flagrou Maomé com uma concubina no dia de Aisha e contou a ela. Ao retornar das montanhas, um mês depois, nenhuma quis deixá-lo.



Ascensão de Maomé

Maomé morreu deitado no chão do quarto de Aisha, com a cabeça no colo dela, em 632. As outras mulheres consentiram que, enquanto tratava de sua doença misteriosa, ficasse com a esposa preferida. O corpo foi enterrado no mesmo cômodo, que passou a ser chamado de Quarto Sagrado.

Com a morte do marido, Aisha se dedicou aos estudos. Tinha 18 anos, mas não teve filhos e foi proibida de casar de novo. Assim como as outras, não recebeu herança do profeta, que doou seus bens para caridade. Mas, pelo Quarto Sagrado, ganhou 200 mil dirhams, tanto dinheiro que precisou de cinco camelos para transportá-lo. As viúvas ficaram conhecidas como Mães dos Crentes e eram muito respeitadas. Em 641, começaram a receber uma pensão do Estado. Por ter sido a favorita, Aisha ganhava mais.

O pai da jovem esposa, Abu Bakr, virou o primeiro califa, sucessor do profeta e com poderes sobre todos os muçulmanos. O posto só foi extinto em 1924, quando a Turquia aboliu o Império Otomano. Mas, até lá, as disputas deixaram marcas. O quarto califa, Uthman ibn Affan, governou por 12 anos conturbados, até ser assassinado e substituído por Ali ibn Abu Talib, primo e genro de Maomé, marido de sua filha Fátima, e um antigo desafeto de Aisha.

Na guerra civil contra Ali, ela protagonizou, em 4 de dezembro de 656, sua primeira e única experiência militar. Por causa de Aisha, o confronto ficou conhecido como a Batalha do Camelo. A viúva poderosa foi à praça de guerra em seu camelo, Askar, dar apoio moral aos aliados, escondida por trás dos véus da sua howdah (o assento alto, usado sobre a sela). Mas Ali a descobriu e ordenou a todos os seus homens que atacassem Askar. O camelo e centenas de soldados morreram e Aisha acabou presa. Os muçulmanos, daí em diante, iriam se dividir entre xiitas, partidários de Ali, e sunitas, do rival Amir Muwiya.

O desastre no campo de batalha afastou Aisha da política e serviu de pretexto para que, no século 10, os muçulmanos atribuíssem à mulher um papel desbotado, escondida sob véus da cabeça aos pés. Na época de Maomé não era assim. Suas esposas usavam véus discretos, cobrindo o colo e apenas parcialmente a cabeça. Aisha morreu em 678, de doença desconhecida. Segundo as feministas, ela foi absolutamente relevante para a construção da tradição islâmica, como demonstram os seus muitos relatos que, mesmo vindos de uma mulher, foram incorporados à Suna.

O caso do colar

Uma carona de camelo gera perigosas suspeitas de adultério




As esposas de Maomé costumavam acompanhá-lo nas batalhas, encarregadas de levar a água, alimentar os guerreiros e cuidar dos feridos. Certa vez, Aisha se desgarrou e o episódio gerou uma crise política para o profeta. Depois da Batalha da Trincheira, contra os judeus, em 628, Maomé passou a fazer expedições fora de Medina. Em uma delas, na hora de levantar acampamento, Aisha se afastou - segundo ela, para urinar - e, na volta, notou que tinha perdido um colar de ágatas. Refez o caminho para procurá-lo e, embora tenha encontrado a joia, perdeu-se do grupo. O condutor dos camelos pensou que ela estivesse na howdah (assento sobre as selas dos camelos), que tinha as cortinas cerradas, e partiu. Aisha, por sua vez, adormeceu, esperando que viessem buscá-la, até ser acordada por um jovem muçulmano, Safwan ibn al-Muattal. Ele a levou a Medina, de carona num camelo. Mas, ao chegarem juntos, suspeitas de traição correram a cidade. O profeta aconselhou-se com o genro Ali ibn Abu Talib, que nunca gostou de Aisha e julgou-a culpada. Procurou a escrava da mulher, que, por sua vez, a defendeu. Resolveu visitar a esposa: “Se você é inocente, Alá vai absolvê-la. Mas, se é culpada, peça pela misericórdia Dele”. Na mesma noite, teve uma revelação. “Alá, o Altíssimo, mostrou que você é inocente”, contou a Aisha. Chicoteou então três acusados de espalhar os rumores e ditou o capítulo 24 do Corão: “São necessárias quatro testemunhas para alguém ser declarado culpado de adultério”.

Contos de fé

Ditados sagrados falam da vida do profeta e ditam normas
A história de Aisha, assim como a de Maomé, foi preservada por meio de relatos feitos por ela mesma e por outros seguidores do profeta. Esses testemunhos são conhecidos como ahadith ou, no singular, hadith (ditado, em árabe). Maomé ditou o Corão, livro sagrado do islamismo. Mas, quando ele morreu, muitas normas de conduta não estavam estabelecidas, e as suas viúvas eram consultadas para desfazer dúvidas éticas. Aisha foi a que mais colaborou. Com excelente memória, lembrava com detalhes de situações pelas quais o profeta passara, o que ele dissera e como teria agido na ocasião. Tornou-se, assim, peça importante para todo o Islã: os milhares de ahadith formam a Suna, o código mais importante dos muçulmanos, depois do Corão. O historiador Imam Bukhari, um dos mais conceituados no Islã, estudou cerca de 500 mil ahadith no século 9 e atestou que apenas 7275 eram verdadeiros. Destes, 2210 são atribuídos a Aisha.


Saiba mais

LIVROS

Maomé: uma Biografia do Profeta, Karen Armstrong, Companhia das Letras, 2002

Biografia de Maomé que conta diversos episódios da vida de Aisha.

The Beloved of Mohammed, Nabia Abbott, The University of Chicago, 1942

A principal biografia de isha.

SITE : www.usc.edu/dept/MSA/fundamentals/hadithsunnah/ - Textos da Suna (em inglês).

Fonte: http://historia.abril.com.br/gente/favorita-profeta-479973.shtml

Imagens: Internet